Translate

quinta-feira, 25 de setembro de 2014

O silêncio de todos nós

Meus caros amigos,

Trabalhando desde junho de 2010 na UTI do Hospital Nossa Senhora da Conceição em Porto Alegre, minha contínua luta contra as barbaridades feitas contra a saúde pública no Brasil são do seu conhecimento. Foi através do blog de Ricardo Setti na Revista VEJA que, no início de 2013, “Santa Maria e a Guerra do Vietnam” (artigo de minha autoria) chegou ao conhecimento público trazendo um sério aviso sobre a vinda dos médicos cubanos. Depois de “Carta à Presidente Dilma” e de uma série de outros textos publicados tanto no meu blog “Ataque Aberto” quanto no grupo de Facebook, “Inglourious Doctors”, comecei a pagar, pessoalmente, dentro do meu emprego, o preço das minhas opiniões políticas.

Assassinar reputações de inimigos não é tática nova da esquerda brasileira. O doutor Romeu Tuma Júnior provou isso ao país. Trabalhando num grupo hospitalar que atende 100% dos pacientes pelo SUS, no qual entrei por concurso público e que é controlado por gente do PC do B, acredito que não seja necessário ser teórico da conspiração para compreender e aceitar o que acontece com aqueles que se opõem ao modelo de gestão de saúde no Brasil. Antiga, mas eficiente, a tática é sempre a mesma: atribuir desempenho ruim nas avaliações funcionais e relatos de conflitos e dificuldade de relacionamento no local de trabalho funcionam como estopim dos processos administrativos, como os quais se pretende “limpar” o serviço público dos opositores.

Ontem, dia 22 de setembro, chegando ao Hospital Conceição para trabalhar na UTI, fui notificado de que meu ponto estava “suspenso”. Encaminhado ao setor de RH recebi informação de que eu mesmo, como médico, estou suspenso do hospital por 60 (sessenta dias) sem perda de remuneração. Argumenta a instituição que isso visa não prejudicar o processo administrativo disciplinar – PAD número 51/14 em que se pretende a minha exoneração. Não sei quais são os termos de acusação; não sei ao que respondo e não tive, até agora, chance de defesa alguma. Em apelação administrativa de avaliação funcional prévia considerada muito insuficiente, testemunhas identificadas como “trabalhador da saúde 1,2,3,4..etc..” me acusam de “não examinar os pacientes, não lavar as mãos, de conflitos com familiares de pacientes da UTI , de jogar equipamentos no chão e não usar equipamentos de proteção individual”. E afirmo que não sei, oficialmente, o nome de NENHUMA das pessoas que disseram isso naquele processo, que não lhes foi exigida prova alguma e que, tomadas como VERDADES corroboradas pela minha chefia tais declarações acabaram com a minha vida funcional.

Meus amigos, o que está acontecendo comigo não é exceção; é a regra sobre aquilo que os médicos brasileiros enfrentam em seu trabalho quando decidem questionar a maneira dessa gente conduzir a saúde pública. Minhas chances no processo administrativo, cuja cópia sequer tenho ainda, não são muitas; na justiça comum acredito que haja alguma alternativa. Resta nesse momento apelar para o que essa gente mais teme: à publicidade, à divulgação em massa e pela imprensa que ainda está livre daquilo que eles querem fazer na surdina. Daquilo que eles fazem melhor e querem esconder: o assassinato de reputação e o total aparelhamento do serviço público no Brasil, garantidos pelo terror infundido sobre seus subordinados. O efeito é garantido por lei: a lei do silêncio de todos nós.

Grande Abraço,

Milton Pires
Médico

Porto Alegre, 23 de setembro de 2013.

http://ataqueaberto.blogspot.com.br/


Fonte: Mídia Sem Máscara

Nenhum comentário:

Postar um comentário